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Marília de Dirceu

Tomás Antônio Gonzaga

Track NameMarília de Dirceu
00:00 / 01:04

Gravado em São Paulo no auditório do Colégio Humboldt em abril/maio de 1985. Gravador Revox A 7 7, dois microfones A KG 1200 em fitas BASF SP 54R .Técnico de gravação e Editor - Conrado Silva / Editado nos Estúdios Tacape, São Paulo. Matrizado na Tapecar, Rio de Janeiro. Produzido por Alma Maria Kieffer e Anna Maria Parsons

Tacape Ltda. edita Marília de Dirceu, doze árias de compositor anônimo do início do século XIX com os textos das Liras de Tomás Antônio Gonzaga, o Dirceu, escritas durante sua prisão na Ilha das Cobras em fins do século XVIII enquanto aguardava o degredo para Moçambique.

ANNA MARIA PARSONS

Capa e Encarte

Textos do Encarte

MARÍLIA DE DIRCEU


Cronologia de Tomás Antônio Gonzaga


11 de Agosto/1744 Nasce no Porto, Miragaia, Tomás Antônio Gonzaga, sétimo filho do Desembargador João Bernardo Gonzaga e sua mulher Dona Tomásia Isabel Jason.


2 de Maio/1746 Falece no Porto Dona Tomásia Isabel Jason.


Dezembro/ 1751 Partida para o Brasil do Desembargador João Bernardo Gonzaga nomeado Ouvidor do Recife, trazendo seus dois filhos Tomás Antônio e José.


11 de Março/1752 Posse do Desembargador Gonzaga.


1752 a 1759 Residência da família Gonzaga no Recife onde os meninos frequentam escola religiosa.


1759 Transferência do Desembargador Gonzaga e sua pequena família para Salvador, onde vai o Desembargador exercer o cargo de Intendente Geral do Ouro, tomando posse em Fevereiro de 1759. Tomás Antônio provavelmente estuda na Bahia com os Franciscanos.


4 de Outubro/1761 Partem para o Reino os dois irmãos Gonzaga para completar seus estudos em Coimbra. Chegam a Lisboa em fins de Dezembro de 1761.


Outubro de 1762 - Tomás Antônio matricula-se no primeiro ano de leis em Coimbra.


Fevereiro/1768 Forma-se Tomás Antônio e segue para o Porto trabalhar à sombra de seu pai já retornado a Portugal.


1778 Tomás Antônio habilita no Desembargo do Paço e obtém despacho final aos 18 de Agosto de 1778. Declara-se na ocasião brasileiro.


1 779 Tomás Antônio é nomeado Juiz de Fora em Beja.


1 78 1 Terminado seu prazo em Beja, Tomás Antônio é nomeado Ouvidor Geral em Vila Rica.


1782 Partida para o Brasil.


10 de Outubro/1782 Chegada ao Rio de Janeiro.


12 de Dezembro/1782 Posse de Tomás Antônio Gonzaga no cargo de Ouvidor em Vila Rica.


1786 É nomeado Desembargador na Bahia, mas consegue permanecer em Vila Rica

.

1 788 Envia Tomás Antônio solicitação à Coroa para seu casamento com Maria Dorotéa de Seixas.


23 de Maio/1789 Tomás Antônio é preso em sua casa, acusado de participação na Conjura contra a Coroa.


1 789 a 1792 Permanece preso no Rio de Janeiro.


1 792 Parte para o degredo em Moçambique.


1810 Falece em Moçambique o Poeta.




A primeira edição deste disco teve o patrocínio da Petrobrás - Petróleo Brasileiro S.A.

Tacape - Série Memória Musical - Estéreo - 016


Fotos da Pastora Primavera e da Casa de Gonzaga - Sérgio Magalhães Trópia Fotos dos intépretes - Frederico Kieffer


Programação visual - Papéis Trocados - Carlos Welker, Diana Almeida, Joel Longo -e Anna Maria Parsons


Tacape Limitada Caixa Postal 112 São João dei Rei CEP 36325 Minas Gerais 1985




Face A

I. Sucede, Marília bela

II. Já, já me vai, Marília, branquejando

III. Os mares, minha bela, não se movem

IV. De que te queixas, língua importuna

V. Eu vejo, ó minha bela, aquele númem

VI. A estas horas eu procurava


Face B

VII. Arde o velho barril

VIII. Ah! Marília, que tormento

XI. Alma digna de mil avós augustos

X. Vejo, Marília, que o nédio gado

XI. Por morto, Marina, aqui me reputo

XII. Se o vasto mar se encapela



Anna Maria Kieffer, voz;

Gisela Nogueira, viola, guitarra;

Edelton Gloeden, guitarra



Falam os intérpretes


Nosso trabalho sobre as doze árias de Marília de Dirceu partiu da edição fac-similar publicada por Mozart de Araujo em A Modinha e o Lundu no Século XVIII, Ricordi, São Paulo, 1963.


Os fac-simili reproduzem as mesmas árias publicadas por Cesar das Neves em seu Cancioneiro de Músicas Populares, Porto, 1893/1898. Segundo Cesar das Neves, os originais lhe foram cedidos por Antonio Luso da Silva, professor do Liceu do Porto.


Eram litografados em caracteres manuscritos e vinham grafados na clave de soprano, com acompanhamento de viola e guitarra, como de uso em fins do Século XVIII e princípios do XIX.


Não aparecia neles o nome do compositor. Ao publicá-los, Cesar das Neves transcreveu os caracteres originais para notação moderna e Com acompanhamento de piano.


Infelizmente, esses originais se perderam. Tentamos, então, nos aproximar da primitiva versão reconstruindo o acompanhamento e nos baseando em métodos de viola e guitarra de fins de Setecentos e começo de Oitocentos.


Neste período, a viola usada em Portugal e no Brasil é a descendente direta da viola da mano ou vihuela, instrumento ibérico muito em voga na Renascença e que chegou a substituir o alaúde nas cortes de Espanha e Portugal.


No período colonial, espalhou-se por toda a América Latina e, com ligeiras variantes, é encontrada ainda hoje, no Brasil, com o nome de viola sertaneja ou viola caipira.


A afinação utilizada na presente gravação é a mesma sugerida por Manuel da Paixão Ribeiro em sua Nova Arte de Viola, Coimbra, 1789 (e'e' bb gg ddD eeE).


A guitarra do início do Século XIX já possui as mesmas características de encordoamento e afinação da guitarra atual que, no Brasil, é mais conhecida com o nome de violão.


As doze árias de Marília de Dirceu pertencem a um gênero de música de sala muito praticado, em Portugal e no Brasil, nos concertos em família.


Por esta razão resolvemos gravar estas obras de forma artesanal, evitando estúdios e procurando um local onde a reverberação natural nos transportasse a um salão da época.


Da mesma forma, optamos por um tratamento vocal onde a articulação do texto poético fosse evidenciada em relação ao volume de voz e dinâmicas usados normalmente em teatros.


Os textos das árias são nada menos do que doze das famosas "liras" que o poeta inconfidente Tomás Antônio Gonzaga dedicou à sua amada Marília.


Todas as liras da presente coleção pertencem à segunda parte da Marília de Dirceu editada em Lisboa em 1799 e escrita por Gonzaga durante a prisão na Ilha das Cobras.


Portanto, as melodias das árias não podem ser anteriores a essa data o que nos obriga a situá-las, inclusive em razão de seus estilos, no início do Século XIX, época em que os poemas de Gonzaga atingiram o máximo de popularidade.


Bibliografia:

Araujo, Alceu Maynard: Folclore Nacional, Edições Melhoramentos, São Paulo, 1964.

Araujo, Mozart: A Modinha e o Lundu no Século XVIII, Ricordi, São Paulo, 1963.

Borba, Tomás e Graça, Fernando Lopes: Dicionário de Música, Edições Kosmos, Lisboa, 1963.

Cascudo, Luis da Câmara: Dicionário do Folclore Brasileiro, Instituto Nacional do Livro, Rio de Janeiro, 1954.

Eulalio, Alexandre: Os melhores poemas de Tomás Antônio Gonzaga, Global Editora, São Paulo, 1983.

Matteis, Nicola: The False Consonantes of Music, London, 1682 / Fac-simili Chanterelle.

Ribeiro, Manuel da Paixão: Nova Arte de Viola, Real Officina da Universidade, Coimbra, 1789.

Ricci, Luigi: Variazioni - Cadenze - Tradizioni per Canto, G. Ricordi e C., Milano, 1945.

Tyler, James: The Early Guitar, Oxford University Press, 1980.



MARILIA DE DIRCEU


A popularidade que os versos da Marília de Dirceu alcançaram foi imediata. A primeira parte da obra apareceu na capital portuguesa no final de 1792. Trazia apenas as iniciais do autor, T. A. G.; este, desde agosto, encontrava-se exilado em Moçambique. Fora para aí na condição de Réu de lesa-Majestade, por se ver envolvido no movimento sedicioso sufocado em 1789 na Capitania das Minas Gerais — conjuração que pretendera instalar uma república no Vice-Reinado do Brasil. (Da condenação a morte inicial ao subsequente exílio perpétuo em Angola, a pena fora comutada em dez anos de degredo na atual Maputo.).


Apesar da desgraça pública do poeta, em junho do ano seguinte, 1793, a Gazeta de Lisboa, diário oficial do Reino, não hesitara anunciar uma segunda tiragem das "lyras do Doutor Thomaz Antonio Gonzaga", que (segundo a mesma Gazeta) vinham merecendo "geral applauso". O lirismo delicado dos versos respirava o frescor de um sentimento todo vivacidade e graça. A fluência inspirada das estrofes cheias de movimento, que falavam de amor de modo tão singular, fez com que esse texto interessasse de imediato a compositores de salão e músicos de esquina. Seria talvez a musicalidade intrínseca que o poeta herdara do bisavô paterno. Este clérigo afamado pelo bom solfejo, fora muito atuante, em fins do Seiscentos, em funções festivas nas igrejas do Rio de Janeiro. Um século depois a sociabilidade do canto profano dominava na metrópole e nas possessões ultramarinas. Os textos de Gonzaga apresentavam-se como dos mais sedutores seja para árias de caráter erudito seja para serestas de corte popular. Logo logo o idílio do pastor Dirceu com a sua doce Marília alcançaria ampla audiência e se espalhava fácil pelo mundo que falava português.


Sete anos após a "primeira parte" sairia do prelo uma "segunda", inédita, de Marília de Dirceu — 1799. Narrava esta o injusto cativeiro do pastor "numa masmorra metido" e o desalento dele agrilhoado no calabouço, onde apenas a lembrança da amada e o desejo urgente de revê-la faziam Dirceu sobreviver na fria depressão do "segredo". O político claro-escuro do tema prisão injusta, sucedendo à bonançosa sinfonia pastoril da primeira parte, acrescentava nota nova e poderosa às cores amenas do romance neo-clássico. Os acordes fortíssimos que abrem o (melo) drama biográfico davam assim novo teor ao texto gonzaguiano, agora ainda mais próximo da sensibilidade em transição do tempo, ansiosa por emoções fortes e sensações inéditas, agora que a História acelerava o seu mesmo curso. A partir daí as edições de Marília de Dirceu suceder-se-ão regularmente, acompanhadas ou não de uma "terceira parte" apócrifa: até 1862 — ano L da primeira tiragem — aparecem 20 edições arroladas pelos bibliográficos, cifra expressiva num ambiente bisonho como o luso-brasileiro, onde eram notórias as dificuldades de publicação em livro. É só pensar, em função disto, na multiplicação de público causada pelo costume da leitura em voz alta, em grupo, o hábito da recitação constante e as versões cantadas dos poemas populares do tempo, — ampliando de modo sensível a audiência desses textos desde o fim do Século XVIII até o ultra-Romantismo avançado.


Esse prestígio ímpar dos versos de Gonzaga aparece confirmado sem sombra de dúvida pelas diversas e variadas adaptações musicais dos textos de Marília de Dirceu que este disco recolhe e divulga de forma primorosa. Não poderia ser mais seguro o índice de popularidade atingido pelo mito dos amantes infelizes de Villa Rica. Todas as Liras aqui reunidas pertencem à "segunda parte" do idílio, aquela de conteúdo mais

patético, por isso mesmo favorecida pelos compositores. Embora ainda não tenha sido efetivada uma busca sistemática em nossos arquivos, que poderão revelar versões da "primeira", foram sempre peças da celebérrima "segunda parte" aquelas recolhidas pelo folclorista português Cesar das Neves nos três compactos volumes do seu Cancioneiro de Músicas Populares. Obra monumental publicada no Porto respectivamente em 1893, ‘95 e ‘98 — com a colaboração de Gualdino de Campos para a parte literária —, dela extraiu Mozart de Araújo em 1963 a coletânea gonzaguiana que aqui vamos ouvir na sensível interpretação de Anna Maria Kieffer, ao mesmo tempo vibrante e suave, acompanhada na viola por Gisela Nogueira e na guitarra por Edelton Gloeden. Canções cujo(s) autor (es) anônimo(s) — pois talvez haja aqui mais de um autor — parece(m) tê-las composto entre 1800 e 1830, talvez mesmo até um pouco depois.


A maioria reproduz ainda o gosto "do decoroso Século XVIII" e são bem árias despejadamente italianizantes da virada do Setecentos para o Oitocentos. Apenas em quatro delas a partitura parece encaminhar-se para um sentimentalismo de marca mais romântica: em "De que te queixas, língua importuna", que rodopia numa espécie de ritmo-mazurca; em "Ah, Marília, que tormento", em "Por morto, Marília, aqui me reputo" e "Se o vasto mar se encapela". As demais, embora preferindo temas de certo apelo dramático, lírico ou pitoresco gratos aos contemporâneos ("Os mares, minha Bela, não se movem", "Vejo, Marília, o nédio gado"; "Arde o velho barril/, Arde a cabeça", etc.), decidem-se pelo ornamental e seguem a tradição das árias do tempo com maneirismos curiosos. Esta atitude, que não parece ser apenas estética, faz com que o compositor (ou um dos compositores) escolhesse, do volume, sem repulsa aparente, um texto do teor de "Alma digna de mil avós augustos". Elogio áulico do mais típico antigo-regime, endereçado pelo Réu aflito à clemência do Capitão-general Barbacena, o músico dele desentranha certo compasso hinário, marcial, que, sem abdicar de filigranas de tessitura, presta reverência ao chefe hierárquico da tradição. Texto bem próximo em espírito, aliás, descontada a ênfase hiperbólica, daquele "Heroe, Egrégio, Douto, Peregrino" do Acadêmico dos Renascidos musicado em 1759 pelo compositor anônimo baiano (ou reinol?) redescoberto pela pesquisa incansável de Régis Duprat. Seria portanto pelo menos aventurosa uma leitura que buscasse encontrar a todo o transe, nestas últimas árias, traços de uma nova sensibilidade pré-romântica.


Documento muito expressivo da nossa cultura na passagem do Século das Luzes para o Século da Fumaça, é evidente que as Liras de Gonzaga postas em música em Portugal e no Brasil no último decênio do Setecentos e nos primeiros do Oitocentos constituem peças do maior interesse num país sem memória como o nosso. Isto não apenas como elemento de tradição que é indispensável não se perder, mas ainda pela aura de autêntica sensibilidade de época que dela se desprende e por si só fala com eloquência daquele tempo que, faz muito, se esvaiu.


O cuidado amoroso com que prepararam esta versão gravada Anna Maria Kieffer, Gisela Nogueira e Edelton Gloeden, que com voz, viola e guitarra recriaram essas canções de autor (es) esquecido(s) - Cesar das Neves levanta a hipótese de ser ele um só: Marcos Portugal —, só pode aumentar o interesse especialíssimo deste disco, precioso por tantos motivos.


ALEXANDRE EULALIO


Pró-Reitoria de Extensão e Cultura | UFSJ

Programa de Extensão Sons das Vertentes | 2023
Departamento de Música

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